sexta-feira, 10 de julho de 2015

O mundo esquecido (5)



Capítulo 5 - Os conselhos do velho mágico

Salvador estava estendido no chão, enquanto o anão dançarino girava e ria à sua volta. Viu que a porta da casa mais alta tinha sido entreaberta e que alguém estava parado na soleira. Levantou-se o mais depressa que conseguiu, envergonhado. Que altura mais despropositada para cair! À sua frente estava uma anã com um avental branco comprido, de braços cruzados e ar aborrecido.

- Mas que brincadeira vem a ser esta? Ah! Aí estás tu! Logo vi que estavas por detrás de todo este rebuliço!

Apontava para o anão dançarino, que rodopiava sem parar e que, ao ver-se descoberto, se afastou para longe, a rir perdidamente. A anã olhou então para Salvador e, com palavras doces, convidou-o a entrar.

 - Entra, entra. Desculpa, tive de ralhar com o anão dançarino, ele não tem emenda. Mas não sou sempre assim, resmungona. Sou até bastante bem disposta! Na aldeia das casas risonhas é impossível não estar alegre. Tu deves ser o Salvador. O guarda avisou-me de que irias chegar para falar com o velho mágico. Ele é o chefe da nossa aldeia.

 - Ele é mágico? Um anão mágico?

- Vem. Ele vai explicar-te tudo.

Pegando na mão de Salvador, a anã conduziu-o por um corredor estreito e de paredes tão altas que, olhando para cima, não era possível ver onde terminavam. O facto de o chão ser muito inclinado, fazia com que eles tivessem de andar muito depressa. Era como se Salvador e a anã tivessem sido engolidos por um animal gigantesco e escorregassem pela sua garganta. Salvador estremeceu: que ideia mais disparatada! 




Entraram então numa sala muito pequena, onde cabiam mesmo à conta dois sofás de veludo vermelho, uma mesa redonda e uma estante carregada de livros. Num dos sofás estava sentado o velho mágico. Ao contrário do que Salvador tinha imaginado, o mágico não era um anão. Diante de si estava um homem encurvado e muito magro, de olhos cor de violeta e longas barbas brancas. Os braços, de tão magros, estavam dobrados de tal forma que pareciam asas, o que o fazia parecer um pássaro. Parecia ter uma idade avançada, e talvez por isso não se levantou quando eles entraram. Apenas sorriu. Salvador gostou imediatamente dele. Então, o velho mágico falou:

- Vem sentar-te ao pé de mim. Sei que o teu nome é Salvador e que vieste do mundo para lá do buraco negro. Sei que gostas de nuvens e que inventas histórias quando olhas para elas. Vieste ver-me porque gostarias de encontrar o caminho de volta para casa. É isso?

Salvador sentou-se, mas não respondeu logo. Ficou a olhar para o velho mágico, fascinado. Como saberia ele o que lhe tinha acontecido, e que gostava de nuvens, se ainda não tinha dito nada? Finalmente conseguiu responder.

- Sim, é isso.

Depois ficou um bocadinho a pensar e perguntou:

- O senhor por acaso conhece uma menina chamada Alice? 

- Não, quem é?

- A Alice também caiu num buraco e encontrou o país das maravilhas. Mas aí havia um gato, e um coelho, e uma rainha, e um chapeleiro louco. Sabe dizer-me se estou nesse país?

 - Não sei que país é esse. Sabes, Salvador, existem muitos lugares fantásticos, só à espera de serem encontrados. Mas nem sempre é fácil descobrir a forma de lá chegar, porque as portas apenas se abrem para alguns. Tu encontraste a entrada para um desses mundos, neste caso o mundo esquecido. Acredito que não foi por acaso. Acho que és um menino muito especial e só por essa razão é que estás aqui.

- Pois, o problema é que não sei voltar. O senhor sabe fazer magia?

- Modéstia aparte, sei alguma coisa sobre o assunto.

- Então podia fazer-me regressar a casa?

- Infelizmente, Salvador, a magia no teu caso não iria resultar. Vais ter de percorrer um longo caminho e de ultrapassar alguns obstáculos para poderes regressar. Mas posso ajudar-te nessa tarefa, dando-te pistas que deverás seguir. Caso contrário, não conseguirás. A entrada para o teu mundo fica para lá do deserto do esquecimento, depois do lago dos nenúfares, no interior da gruta das mil vozes.

- A gruta das mil vozes? De quem são essas vozes?

- São vozes esquecidas, perdidas no tempo, ninguém sabe a quem pertencem. Mas elas irão guiar-te e deverás escutá-las com muita atenção. Podes dormir aqui esta noite e amanhã bem cedo deves partir, porque o caminho é longo.

Nessa altura, o mágico esticou o braço (que parecia mesmo a asa de um pássaro) e pegou numa caixa que estava pousada sobre a mesa. Abriu-a com muito cuidado e tirou lá de dentro uma pedra branca, redonda e pequena como um ovo de codorniz, que ofereceu a Salvador. Disse-lhe:

- Esta é uma pedra mágica, Salvador. Sempre que te sintas perdido e sem saberes o que fazer, encosta-a junto do ouvido. Então, ouvirás a minha voz e saberás como continuar o caminho. Não podes perdê-la, de modo nenhum, ou não conseguirás voltar a casa. Agora, deves descansar.

A seguir, o velho mágico passou a mão sobre os olhos de Salvador, que ficou a dormir profundamente. Embora ele estivesse adormecido, o mágico disse-lhe ainda muitas outras coisas, para que as recordasse no momento certo. 




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